Fulano não poderia mesmo ter sido muita coisa, e não estou falando de ter ou não uma profissão, não é o caso quanto a profissão dos sonhos que qualquer mãe ‘normal’ consegue imaginar para o próprio filho, não é isso! Fulano sequer tinha uma opinião e uma dimensão qualquer da própria consciência, nem mesmo para dizer que era distorcida ou sem profundidade, mas nem chegou perto disso! Assim, logo posso afirmar que é muito mais difícil avançar na vida sem um mínimo de noção das coisas mais básicas do mundo real; quanto a saber o que poderá ser essa mesma expectativa de uma vida minimamente decente a deixar que tudo continue apenas em pensamento, ao mesmo tempo – e contraditoriamente – permanecer a negar o exercício de pensar a vida como algo possível e maior. Você ficou confuso?! Não se preocupe, eu explico mais à frente!
Fulano não poderia ter ido a lugar algum, afinal de contas essa personalidade sem muitas vezes sem caráter não sabia nem onde estava. Fulano não poderia dizer de fato se gostava ou não de determinada coisa, qualquer coisa; fosse uma comida, uma bebida, uma música, um livro. Ele acreditava possuir gosto próprio, mas será que isso fazia mesmo algum sentido? Quanto a ter alguma noção a respeito de um livro de filosofia? Nada! Como Fulano poderia opinar a respeito de tema tão difícil e tão controverso?! Algo que nem sequer se aproxima da compreensão tranquila de uma equação simples de matemática, algo do tipo… 2+2=4. Imagina o Fulano tentando entender o que é uma cosmovisão, transcendência, autoconhecimento, potência e ato?! Até que um dia nem mesmo a matemática lhe restou como um “porto seguro”. Nem mesmo essa simples equação pode mais servir a Fulano como uma base “segura” de um raciocínio, pois um dia chegou um maluco e o convenceu de que nem sempre dois-mais-dois-é-igual-a-quatro, “às vezes dá outro número”, disse o cara com um sorriso esquisito. Aí que tudo ferrou de vez! Fulano sequer teve argumento para contrapor a essa ideia aparentemente absurda, de repente o cara estava tratando o abstrato como se fosse um fato absoluto. Mas na hora, ninguém se deu conta disso. Fulano, nosso protagonista avoado, permaneceu estático.
Depois o cara começou com aquela conversa fiada a respeito de que “o passado não existe e que o futuro nunca chegará”. Putz! A cabeça travou de vez, como assim?! E voltou a se aprisionar nos próprios pensamentos: “E todas essas memórias que eu tenho dentro da minha cabeça ou… será que é no coração…? A respeito de uma grande emoção ao encontrar a mulher da minha vida! Um desses momentos maravilhosos que eu vivi, ou até mesmo o que eu poderia fazer com os meus traumas, com aqueles acontecimentos que só de lembrar minha boca fica seca, meu coração dispara e eu começo a sentir uma raiva incontrolada como se estivesse mesmo por reviver aquele momento em que eu queria ter dado uma porrada naquele cara que me fechou no trânsito?” Ufa! Isso só foi um pensamento repetitivo que obviamente não vale a pena ser relembrado! Fulano então, logo esqueceu desse troço todo!
Esse personagem é fictício, ou poderia apenas ser uma persona da imaginação de um escritor, mas o fato é que a maioria das pessoas são assim, não conseguem separar o que é imaginação do que é real. E a maioria nem desconfia disso!
E agora eu volto a falar diretamente com você leitor! Pensar não é o suficiente para dizer “eu sei”! “Saber” é mais importante do que dizer “Eu Penso”. Obviamente que essa é uma contradição em termos, ao concluir que o ato de pensar é que pode nos levar ao ponto de um possível Saber! De início já começo negando a um dos silogismos mais famosos da humanidade que pertence ao filósofo Descartes, e que logo eu – aqui, agora – (folgado pra caramba!) estarei corrompendo um silogismo: “Penso, logo não necessariamente eu existo!”. Pois o que estou eu pensando é mais importante do que o que eu estou fazendo? Ou melhor: O que estou a fazer com os meus pensamentos? Uma coisa que não vale a pena ser vivida deve também ser esquecida ou nem mesmo pensada? Ou não devo nem mesmo deixar que ocorra sequer como um pensamento de um falso pensamento inconsciente? Caramba! Ferrou de vez!
Bem! Agora podemos retornar ao que foi citado no início do texto. O que fazer se não pretendo colocar em prática ao menos uma mínima parte daquilo que acredito ser capaz de pensar? Devo então reavaliar o que merece ou não ser “pensado”?! Se a vida é algo que apenas ocorre na prática (“Teoria do Inexistente” tem isso contido no meu livro Soslaio), eu devo (ou deveria) ser capaz de distinguir um pensamento de um acontecimento real, distinguir fantasia de realidade, diferenciar o que desejo daquilo que é possível de ser realizado, e não mais confundir vontade com opinião, não confundir uma possibilidade com um fato, não se deixar levar por um pensamento como se tudo que se passa pela cabeça de um ser humano pudesse de fato ser a realidade idêntica na cabeça de outro ser humano. Resumindo; o que acontece no mundo dos meus pensamentos certamente não terá nada – em absoluto – (ou muito pouco) a ver com o que acontece na sociedade como um todo. E assim, concluo que a única maneira de obtermos um mínimo de possibilidade de convivência social saudável, é de fato respeitarmos integralmente a Vida e a Liberdade; a nossa e a de qualquer outra pessoa. Ao acreditar que o mundo real é o que está na minha mente, acabo (inconscientemente ou quase isso) por agir como um totalitário, um projeto futuro de ditador, ou até mesmo passo a aceitar que o outro o faça, ainda que em pensamento (prestes a desejar que eu – ou o outro) tenhamos o controle de tudo ao redor. E quem será esse eu – ou esse outro – senão mesmo um projeto futuro de ditadorzinho? O que está faltando nas pessoas é assumir as rédeas das próprias vidas. Caso contrário a frase de Nietzsche continuará a fazer muito sentido: “Quem não governa a si mesmo deve obedecer!”.